14/10/2011

Prefeitura de SP indenizará por divulgar vencimentos de servidoras em site

A 6ª câmara de Direito Público do TJ/SP condenou a prefeitura de São Paulo a pagar indenização por danos morais a cinco funcionárias que tiveram seus nomes e vencimentos divulgados no site 'De olho nas contas'. Cada uma receberá R$ 5 mil.

A decisão de primeira instância havia determinado que os nomes das servidoras fossem excluídos da página. As autoras da ação recorreram ao TJ/SP pleiteando também a indenização por danos morais. A prefeitura alegava que a publicação das informações atenderia ao interesse público.

De acordo com o voto do relator do recurso, desembargador Leme de Campos, a legislação determina a publicidade de nome, cargo e unidade de trabalho dos servidores. No entanto, não há norma que autorize a divulgação dos vencimentos.

"Mostra-se ilegal a conduta da ré, uma vez que a publicação de tais dados somente poderia ser determinada mediante lei expressa nesse sentido. E consoante já decidiu o Órgão Especial deste Egrégio Tribunal de Justiça, a divulgação de tais informações viola os direitos fundamentais à intimidade e à privacidade dos servidores públicos municipais", afirmou o relator.

Os desembargadores Sidney Romano dos Reis e Carlos Eduardo Pachi também participaram do julgamento do recurso e acompanharam o voto do relator.

Veja abaixo a íntegra da decisão
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ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação................, da Comarca de São Paulo, em que são apelantes/apelados xxx, xxxx, xxxxxx, xxxx e xxxxx sendo apelado/apelante PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO PAULO.

ACORDAM, em 6ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso do autor, prejudicado o do réu. V. U. dá-se provimento ao recurso das autoras, nos termos acima expostos e nega-se provimento ao recurso da Municipalidade.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores OLIVEIRA SANTOS (Presidente sem voto), SIDNEY ROMANO DOS REIS E CARLOS EDUARDO PACHI.

São Paulo, 3 de outubro de 2011.

LEME DE CAMPOS

RELATOR

RESPONSABILIDADE CIVIL - Indenização por danos morais - Divulgação dos nomes e vencimentos das servidoras públicas municipais em site institucional da Prefeitura de São Paulo - Ato administrativo ilegal Ofensa à intimidade e privacidade das servidoras - Dano moral configurado Correção monetária e juros de mora na forma do art. 1º-F da Lei nº. 9.494/97, com redação determinada pela Lei nº. 11.960/09 Ação julgada parcialmente procedente Sentença reformada Recurso das autoras provido e recurso da Municipalidade não provido.

Cuida-se de ação ordinária ajuizada contra a PREFEITURA

MUNICIPAL DE SÃO PAULO, objetivando a exclusão dos salários vinculados aos nomes das requerentes, da lista constante no site da ré e a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais em razão divulgação de seus nomes e respectivos vencimentos em site da Prefeitura.

A r. sentença de fls. 134/142, julgou parcialmente procedente a ação para determinar que a Municipalidade exclua o nome das requerentes e a respectiva vinculação dos vencimentos do site “De olho nas contas”. Em face da sucumbência recíproca, determinou que cada parte arcará com metade das custas processuais, suportando cada uma os honorários de seus advogados, observada a condição das autoras que são beneficiárias da Assistência Judiciária Gratuita.

Apelam as autoras às fls. 148/156, pleiteando a indenização por danos morais e também, a condenação da ré ao pagamento do ônus sucumbenciais.

A Municipalidade de São Paulo recorre às fls. 180/193, alegando que a divulgação dos nomes e vencimentos dos servidores públicos municipais é legal e constitucional e, portanto, requer a reforma da sentença para julgar improcedente o pedido da inicial.

Contra-razões às fls. 199/225 e fls. 227/238, ambas pelo não provimento do apelo da parte contrária.

É o relatório.

Assistem razão às autoras.

Conforme se verifica dos autos, trata-se de ação ordinária através da qual buscam as autoras a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais em razão da divulgação de seus nomes e respectivos vencimentos em site da Prefeitura Municipal de São Paulo.

Em sua defesa, a ré aduz que a publicação de tais informações visa ao atendimento do interesse público e que a divulgação de tais informações não caracteriza afronta aos direitos assegurados pelo art. 5º, X, da CF, sendo descabida a pretensão das autoras ao recebimento de indenização a título de danos morais. Sem razão, contudo, a ré.

Com efeito, assim dispõe a Lei nº. 14.720/08, acerca da publicação de informações sobre funcionários, empregados e servidores vinculados ao Poder Público Municipal, no endereço eletrônico do órgão em que se encontram em exercício:

“Art. 1º. O Poder Público Municipal, por meio de todos os órgãos integrantes da Administração Pública Direta, Indireta, Fundacional ou Autárquica e do Poder Legislativo, inclusive o Tribunal de Contas do Município, deverá incluir,nos respectivos sítios na "Internet”, uma relação contendo as seguintes informações sobre seus funcionários, empregados e servidores:

I - nome completo;

II - cargo que ocupa;

III - unidade em que exerce o cargo;”

O Decreto Municipal nº. 50.070/08, por sua vez, regulamentou o referido diploma legal, dispondo em seu art. 2º. que:

“Nos sítios da Internet de cada órgão ou ente integrante da Administração Municipal Direta e Indireta, será incluída relação, em listagem única, obedecida a ordem crescente do número de registro funcional, contendo as seguintes informações sobre seus funcionários,empregados e servidores:

I - nome completo;

II - cargo que ocupa;

III - unidade em que exerce o cargo.

Parágrafo único. As informações contidas na listagem de que trata este artigo serão atualizadas a cada 30 (trinta) dias.”

Da análise dos referidos diplomas, verifica-se que inexiste previsão normativa que autorize a divulgação dos vencimentos dos servidores públicos municipais pela Prefeitura de São Paulo. Mostra-se ilegal, por conseguinte, a conduta da ré no caso em tela, uma vez que a publicação de tais dados somente poderia ser determinada mediante lei expressa nesse sentido.

E consoante já decidiu o Órgão Especial deste Egrégio Tribunal de Justiça, a divulgação de tais informações viola os direitos fundamentais à intimidade e à privacidade dos servidores públicos municipais. Nesse sentido:

“MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO - SINDICATO DOS EMPREGADOS DE EMPRESAS DE PROCESSAMENTO DE DADOS - ATO ADMINISTRATIVO - DIVULGAÇÃO EM SÍTIOS DA INTERNET DE NOMES, CARGOS, LOTAÇÕES E VENCIMENTOS DOS REFERIDOS SERVIDORES - DIREITO À PRIVACIDADE, INTIMIDADE E SEGURANÇA DOS SERVIDORES PÚBLICOS VIOLADOS - PUBLICIDADE ADMINISTRATIVA QUE AFRONTOU DIREITOS FUNDAMENTAIS DOS CIDADÃOS - INOBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE – ATO ADMINISTRATIVO ILEGAL – ORDEM CONCEDIDA.” ADEMIR BENEDITO, Órgão Especial, j.10/03/2010).

“MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO - IMPETRAÇÃO EM FACE DA DIVULGAÇÃO, NO SÍTIO ELETRÔNICO DA MUNICIPALIDADE DE SÃO PAULO, DA LISTA COM OS NOMES, CARGOS, LOTAÇÕES E REMUNERAÇÃO BRUTA DOS SERVIDORES MUNICIPAIS - VIOLAÇÃO DO DIREITO FUNDAMENTAL À INTIMIDADE E PRIVACIDADE - DEVER CONSTITUCIONAL DE PUBLICIDADE QUE NÃO SERVE A LEGITIMAR A CONDUTA DA ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL - PREVALÊNCIA DO DIREITO FUNDAMENTAL, ATÉ MESMO EM RESPEITO À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA – ATO ADMINISTRATIVO QUE SE REPUTA ABUSIVO E DESARRAZOADO - PRECEDENTE DESTE COLENDO ÓRGÃO ESPECIAL – PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DO EXMO. SR.PREFEITO MUNICIPAL REJEITADA, POR MAIORIA, SEGURANÇA CONCEDIDA, PREJUDICADO O AGRAVO REGIMENTAL.”(Mandado de Segurança, Rel. MATHIAS COLTRO, Órgão Especial, j. 31/03/2010).

Assim, a conduta da Administração afigura-se ilegal e causa evidente prejuízo às servidoras que tiveram sua vida privada devassada.

Mostra-se descabida, no mais, a argumentação da Municipalidade no sentido de que a sua conduta estaria fundamentada nos princípios da publicidade, moralidade e supremacia do interesse público, uma vez que os referidos princípios não são absolutos, devendo a Administração observar os direitos fundamentais à intimidade e vida privada dos servidores, igualmente albergados pela Constituição Federal. Deve ser acolhida, por conseguinte, a pretensão de indenização por danos morais, porquanto violados direitos da personalidade das autoras, previstos no art. 5º., X da CF. Consoante já decidiu este Egrégio Tribunal em casos análogos:

“OBRIGAÇÃO DE FAZER c.c. Indenização por ANOS MORAIS - Servidores Públicos Municipais. Nomes e vencimentos divulgados pela internet em site institucional da Prefeitura paulistana. Ato administrativo ilegal. Direito fundamental à intimidade, privacidade e segurança - Danos morais in re ipsa configurados - Sentença de improcedência reformada - Recurso provido.” (Apelação, Rel. PEIRETTI DE GODOY, 13ª Câmara de Direito Público, j.15/09/2010).

“REPARAÇÃO DE DANOS - Municipalidade - Lei Municipal n° 14.720/08 e respectivo Decreto Regulamentador - Indenização - Pretensão ao percebimento de indenização por danos morais em razão da divulgação em site da Municipalidade de lista individualizada com onome e a remuneração percebida pelos servidores municipais - Admissibilidade -Violação do direito fundamental à intimidade e privacidade - Dever constitucional de publicidade que não serve a legitimar a conduta da administração municipal – Responsabilidade do Município reconhecida - Artigo 37, § 6o, da Constituição Federal) - Termo "a quo" dos juros de mora incidentes a partir do evento danoso, por se tratar de responsabilidade extracontratual - Sentença de procedência - Decisão mantida - Recurso improvido.” Rel. REBOUÇAS DE CARVALHO, 9ª Câmara de Direito Público, j. 18/08/2010). “ORDINÁRIA - INDENIZAÇÃO – DANO MORAL CAUSADO PELA DIVULGAÇÃO NA "INTERNET" DO NOME DE SERVIDORA MUNICIPAL DE SÃO PAULO E RESPECTIVO SALÁRIO - RECONHECIMENTO – CONDUTA DO ADMINISTRADOR NÃO PREVISTA NA LEI 14.720/08, REGULAMENTADA PELO DECRETO 50.070/08 QUE A ENSEJARAM - OFENSA AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE QUE VIOLOU A GARANTIA CONSTITUCIONAL AO SIGILO DE DADOS E, EM ÚLTIMA ANÁLISE, À SEGURANÇA DO INDIVÍDUO, CAUSANDO CONSTRANGIMENTO PASSÍVEL DE INDENIZAÇÃO - FIXAÇÃO DE MODO A SATISFAZER A DOR CAUSADA, SEM GERAR ENRIQUECIMENTO INDEVIDO E AINDA EVITAR NOVA OFENSA - JUROS NOS TERMOS DO ARTIGO 1"-F, DA LEI 9.494/97, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.960/09.” (Rel. FERRAZ DE ARRUDA, 13ª Câmara de Direito Público, j.15/09/2010).


O problema, por certo, reside na quantificação do dano moral, pois objetiva-se apenas uma compensação pelos males sofridos, não se conseguindo mensurar a dor da vítima. Em nosso sistema vige o critério do arbitramento pelo juiz para a fixação do “quantum” devido a título de dano moral, sendo certo que o magistrado tem que agir com prudência ante as peculiaridades e repercussão econômica da indenização, a fim de que esta não se converta em fonte de enriquecimento e tampouco em valor inexpressivo.Não se perca de vista, a “(...) na reparação do dano moral não há ressarcimento, já que é praticamente impossível restaurar o bem lesado, que, via de regra, tem caráter imaterial. O dano moral resulta, na maior parte das vezes, da violação a um direito da personalidade: vida, integridade física, honra, liberdade etc. Por conseguinte, não basta estipular que a reparação mede-se pela extensão do dano. Os dois critérios que devem ser utilizados para a fixação do dano moral são a compensação ao lesado e o desestímulo ao lesante, inibindo comportamentos lesivos.

Inserem-se neste contexto fatores subjetivos e objetivos, relacionados às pessoas envolvidas, com a análise do grau da culpa do lesante, de eventual participação do lesado no evento danoso, da situação econômica das partes e da proporcionalidade ao proveito obtido com o ilícito. Em suma, a reparação do dano moral deve ter em vista possibilitar ao lesado uma satisfação compensatória e, de outro lado, exercer função de desestímulo a novas práticas lesivas, de modo a 'inibir comportamentos anti-sociais do lesante, ou de qualquer outro membro da sociedade', traduzindo-se em 'montante que represente advertência ao lesante e à sociedade de que não se aceita o comportamento assumido, ou o evento lesivo”.(Curso de Direito Civil Brasileiro - Ed. Saraiva 18ª ed. 2004, p. 105).

No caso concreto, considera-se como razoável para a indenização o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a cada autora, quantia esta adequada à compensação do sofrimento causado, sem, por outro lado, configurar enriquecimento sem causa. Observe-se que tal quantia deverá ser acrescida de juros de mora e correção monetária, ambos contados deste julgamento, como seguro é o entendimento jurisprudencial (RSTJ vol. 112/184 e REsp nº. 899.719-RJ j. de 14.08.07 Rel. Min. CASTRO MEIRA, dentre outros arestos no mesmo sentido). Tendo a presente ação sido ajuizada (05.03.22010) após a entrada em vigor da Lei nº. 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº. 9.494/97, devem ser utilizados os índices oficiais de atualização monetária e juros aplicados à caderneta de poupança, na forma determinada por aquele dispositivo. Cabível, outrossim, a condenação da ré à retirada das informações relativas ao vencimento das autoras do site da Prefeitura, no prazo máximo de 10 dias. Destarte, faz-se de rigor o provimento do recurso, a fim de se julgar procedente o pedido. Em razão da sucumbência preponderante, arcará a ré ainda com o pagamento de custas, despesas processuais e honorários advocatícios arbitrados equitativamente em R$ 1.000,00 (um mil reais), na forma do art. 20, § 4º., do CPC.

Isto posto, dá-se provimento ao recurso das autoras, nos termos acima expostos e nega-se provimento ao recurso da Municipalidade.

LEME DE CAMPOS

Relator
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Esta matéria foi colocada no ar originalmente em 14 de outubro de 2011.
ISSN 1983-392X
Fonte: Migalhas - http://www.migalhas.com.br/

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