26/11/2013

DECISÃO FAVORÁVEL CONTRA A FIDC NPL I - NEGATIVAÇÃO INDEVIDA NO SERASA/SCPC - DANOS MORAIS DEVIDOS


G. D. L. ajuizou a presente ação declaratória de inexigibilidade de cobrança, cumulada com indenização por danos morais, com pedido de antecipação de tutela, em face  de  FUNDO  DE  INVESTIMENTO  EM  DIREITOS  CREDITÓRIOS  NÃO PADRONIZADOS NPL  I, alegando, em  síntese, que a    inscreveu o  seu nome nos cadastros dos  órgãos  de  proteção  ao  crédito,  em  razão  do  inadimplemento  do  contrato  n.º 0577000215470-32.

Relatou que não celebrou o aludido contrato; e que a negativação lhe causou danos morais. Requereu a antecipação dos efeitos da  tutela para excluir seu nome dos cadastros dos  órgãos  de  proteção  ao  crédito.  Pugnou  pela  procedência  da  ação,  com  a  declaração  de inexigibilidade  da  dívida  que  deu  causa  à  negativação,  a  determinação  do  cancelamento  do apontamento  e  a  exclusão  definitiva  do  nome  da  autora,  dos  cadastros  de  inadimplentes;  e  a condenação da ré ao pagamento de indenização, a título de danos morais, em valor a ser arbitrado pelo  juízo,  acrescida  das  custas  e  dos  honorários  advocatícios.  Juntou  os  documentos  de  fls. 04/13.

A inicial foi emendada(fls.22/24), por determinação do juízo.

Indeferido o benefício da justiça gratuita, referida decisão foi objeto de agravo de instrumento, ao qual foi dado provimento (fls. 65/66 e 188/200).

Citado (fls. 73), o réu apresentou contestação (fls. 83/97). Em sua defesa, alegou, em síntese, que adquiriu do Banco Santander   mediante cessão de crédito   os direitos relativos ao contrato que deu origem à negativação  referida na  inicial. Sustentou a  inocorrência de danos

morais,  eis  que  a  inscrição  do  nome  da  autora,  junto  aos  órgãos  de  proteção  ao  crédito,  foi providência legítima, ante o inadimplemento da avença. Pugnou pela improcedência da demanda.

Juntou os documentos de fls. 98/119.

Houve réplica (fls. 123/145).

O  réu  apresentou  o  contrato  que  teria  dado  origem  à  negativação  referida  na inicial (fls. 162/172), sobre o qual a autora se manifestou( fls. 176/178).

Instadas  à  especificação  de  provas, manifestaram-se  as  partes  pelo  julgamento antecipado (fls. 187 e 201).

É o relatório.

DECIDO.

Conheço diretamente do pedido, nos termos do artigo 330, inciso I, do Código de Processo Civil, eis que os contornos da lide não demandam dilação probatória, sendo suficientes à solução da controvérsia os documentos trazidos aos autos.

Não foram arguidas preliminares, razão pela qual passo ao mérito.

Os pedidos são procedentes, em parte.

A autora alega que não  foi notificada da cessão de crédito noticiada pelo  réu; e que sofreu danos morais, por abalo de crédito, em razão da negativação indevida promovida pelo requerido.

A  relação  jurídica  estabelecida  entre  as partes  é nitidamente de  consumo  e, por isso, exige análise dentro do microssistema protetivo  instituído pela Lei nº 8.078/901, sobretudo quanto à vulnerabilidade material e à hipossuficiência processual do consumidor, ainda que por equiparação.

Impossível é, dentro do sistema constitucional vigente, presumir-se situação em prejuízo  do  consumidor,  sobretudo  se  considerados  o  equilíbrio  e  a  boa-fé  objetiva  (vigas medulares das relações de consumo), nem de longe arranhados por meras conjecturas ou ilações.

Incide, in casu, a teoria do risco proveito, fundada na livre iniciativa, que relega ao  empreendedor,  de  modo  exclusivo,  o  ônus  da  atividade  econômica  lucrativa  explorada  no mercado, tanto é que o dever de indenizar surge independentemente da existência de culpa.

Destaque-se, aqui, a lição de Luiz Antonio Rizzatto Nunes:

O  que  acontece  é  que  o  CDC,  dando  continuidade,  de  forma  coerente,  à normatização  do  princípio  da  vulnerabilidade  do  consumidor  no  mercado  de consumo, preferiu que toda a carga econômica advinda do defeito recaísse sobre o prestador do  serviço. Se a hipótese é de caso  fortuito ou de  força maior e em função disso o consumidor sofre acidente de consumo, o mal há de ser remediado pelo  prestador  do  serviço.  Na  verdade  o  fundamento  dessa  ampla responsabilização é, em primeiro lugar, o princípio garantido na Carta Magna da liberdade  de  empreendimento,  que  acarreta  direito  legítimo  ao  lucro  e responsabilidade  integral pelo risco assumido. E a Lei nº 8.078, em decorrência desse  princípio,  estabeleceu  o  sistema  de  responsabilidade  civil  objetiva, conforme    visto.  Portanto,  trata-se  apenas  de  questão  de  risco  do empreendimento.  Aquele  que  exerce  a  livre  atividade  econômica  assume  esse risco integral.( Curso de Direito do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004, págs. 301/302, i. 15.16.2.)
 

Em  outras  palavras,  se  os  lucros  não  são  divididos  com  os  consumidores,  os riscos também não podem ser.

POIS BEM, CABIA AO RÉU, APÓS A CESSÃO DO CRÉDITO E ANTES DE EFETUAR A INSCRIÇÃO DO NOME DA SUPOSTA DEVEDORA NOS CADASTROS DE INADIMPLENTES, NOTIFICÁ-LA DAQUELA CESSÃO, FACULTANDO-LHE O PAGAMENTO DA DÍVIDA OU A OPOSIÇÃO CONTRA EVENTUAL COBRANÇA INDEVIDA, O QUE NÃO FOI FEITO. Não resta dúvida de que, na espécie, a inserção do nome da autora, nos cadastros de restrição de crédito, foi irregular e indevida.

Neste sentido segue o entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo:

"DANO  MORAL    Indenização    Inserção  do  nome  do  autor  em  cadastro restritivo de crédito   Cessão de crédito não notificada ao devedor    Inoponibilidade do pacto em  relação  a  ele    Inteligência  do  art.  290  do  Código  Civil    Negativação  indevidamente procedida  pelo  cessionário    Negligência  caracterizada    Dano  configurado    Indenização imaterial  que  se  revelou  equitativa  e  suficiente    Sentença  mantida    Recurso  não  provido.” (TJSP   AC nº 991.09.028850-6   Relator Maia da Rocha   j. 03.03.2010)
 

Ineficaz, perante a devedora dela não notificada, a cessão de direitos creditórios mencionada,  e  indevida,  portanto,  a  restrição  promovida  pelo  réu,  razão  pela  qual  deve  ser excluído, em definitivo, o referido apontamento.

Não há falar, porém, em inexistência e/ou inexigibilidade do crédito em nome da cessionária, apenas na ineficácia da cessão perante a devedora, enquanto não notificada.

O  dano,  na  espécie,  é  in  re  ipsa,  que  dispensa  prova  de  maiores  reflexos, patrimoniais ou morais.

"A  jurisprudência desta Corte está consolidada no sentido de que na concepção  moderna  da  reparação  do  dano moral  prevalece  a  orientação  de  que  a  responsabilização  do agente  se  opera  por  força  do  simples  fato  da  violação,  de modo  a  tornar-se  desnecessária  a prova do prejuízo concreto.

Como  se  trata de algo  imaterial ou  ideal, a prova do dano moral não pode  ser feita  através  dos mesmos meios  utilizados  para  a  comprovação  do  dano material.  Por  outras palavras,  o  dano moral  está  ínsito  na  ilicitude  do  ato  praticado,  decorrente  da  gravidade  do ilícito em si, sendo desnecessária sua efetiva demonstração, ou seja, como já sublinhado: o dano moral  existe  in  re  ipsa"  (STJ    REsp    608.918/RS    Relator  Ministro  José  Delgado    j. 20.05.2004).

 
Mister se faz, neste passo, trazer à colação o magistério de Carlos Alberto Bittar. Vejamo-lo:

"Despreza-se, assim, a investigação do subjetivo do ofensor (dolo ou culpa), visto que  basta  a  lesão  em  si mesma.  Evidenciada  a  conduta  lesiva,  ou  definida  objetivamente  sua repercussão  negativa,  surge  a  obrigação  de  reparar.  O  dano  moral  existe  no  próprio  fato violador dos direitos da personalidade da vítima (ex facto), impondo a necessidade de resposta,que  na  reparação  se  efetiva. É  o  que  se  denomina  damnum  in  re  ipsa."  (Reparação Civil  por Danos Morais. 2ª Ed. São Paulo: RT, 1994, p. 203/204.)

 "Em se tratando de indenização decorrente da inscrição irregular no cadastro de inadimplentes,  a  exigência  de  prova  do  dano  moral  (extrapatrimonial)  se  satisfaz  com  a demonstração da existência da inscrição irregular nesse cadastro. 

Já assentou a Corte, em monótona jurisprudência, que provado o fato que gerou o dano moral, no caso, a inscrição indevida em cadastro negativo, impõe-se a condenação." (STJ  REsp nº 436.850/RO   Relator Ministro Carlos Alberto Menezes Direito   j. 05.12.2002.)

 Quanto ao valor da  indenização pleiteada, a  finalidade do  instituto não pode  ser esquecida, ou seja, o quantum arbitrado deve perseguir a punição do ofensor, para desestimulá-lo do cometimento de novas ofensas, bem como a compensação da ofendida pelos danos suportados, sem causar, todavia, o enriquecimento sem causa desta última.

 "Na  fixação da  indenização por danos morais deve-se  ter em conta a satisfação do lesado e a repercussão econômica do quantum fixado no patrimônio do que pratica a lesão...", além  "das  condições  das  partes,  principalmente  o  potencial  econômico-social  do  lesante,  a gravidade  da  lesão,  sua  repercussão  e  as  circunstâncias  fáticas."  (cf.  Ac.    Câm.  Civ.  Cio TAMG, na Ap. Cív. 227.912.3, j. 19.02.97, (RJTAMG 66/148) e 2ª Câm. Civ. do TAMG, na Ap. Cív.  208.478-4,  j.  22.12.95,  apud  JOÃO ROBERTO PARIZATTO,  in DANO MORAL, doutr., jurispr., prática forense, 1ª ed. Edipa, 1998, pág. 35).

Arbitro  o  valor  da  indenização  em  R$3.000,00  (três  mil  reais),  que  considero suficiente e razoável para atender à finalidade do instituto, acima mencionada.

Ante  o  exposto  e o mais que dos  autos  consta, JULGO PROCEDENTES,  em parte, os pedidos formulados por G. D. L. contra FUNDO DE INVESTIMENTO EM  DIREITOS  CREDITÓRIOS  NÃO  PADRONIZADOS  NPL  I, 

para:  1-  determinar  a exclusão  do  nome  da  autora  dos  órgãos  de  proteção  ao  crédito,  relativamente  ao  contrato  n. 0577000215470-32 e respectivo débito, tornando definitiva a liminar concedida;

e 2- condenar a ré  ao pagamento de  indenização por danos morais,  à  autora, no valor de R$ 3.000,00  (três mil reais), que deverá  ser corrigido, pela Tabela do E. Tribunal de  Justiça do Estado de São Paulo,  desde a data desta sentença (Súmula n. 362, do STJ), e acrescido de  juros  legais de 1% ao mês, desde a citação. 

Ante  a  sucumbência  recíproca,  as  custas  serão  divididas  na  proporção  de  50% para  cada  parte,  compensando-se  os  honorários  advocatícios.  Fica  a  autora  isenta  daquele pagamento, por se tratar de parte beneficiária da justiça gratuita e enquanto perdurar tal condição,nos termos do artigo 12, da Lei n. 1.060/50.

No  mais,  retifique  a  serventia  o  polo  passivo,  para  dele  constar  FUNDO  DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS NÃO PADRONIZADOS NPL I.

P.R.I.C.

São Paulo, 25 de novembro de 2013.

Processo nº 1020794-65.2013 (OBS: decisão sujeita a recurso).

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