06/05/2013

CONDENAÇÃO FAVORAVEL – PLANO DE SAUDE CONDENADO EM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS POR NEGATIVA DE ATENDIMENTO EM CASO DE CIRURGIA.




ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0204919-30.2009.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante MEDIAL SAÚDE S/A, é apelado M. D. F. M.. ACORDAM, em 10ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores JOÃO CARLOS SALETTI (Presidente sem voto), CARLOS ALBERTO GARBI E COELHO MENDES.

São Paulo, 23 de abril de 2013.



Voto nº 18.319

RECURSO Alegado intuito procrastinatório Não configuração Pedido de condenação da ré ao pagamento de multa afastado. PLANO DE SAÚDE Negada autorização de procedimento cirúrgico em hospital não credenciado Alegada disponibilização de melhores recursos na unidade indicada pelo médico assistente Ausente prova da existência de hospital conveniado adequado a prestar o atendimento Afastada a hipótese de livre opção pelo autor Incidência do artigo 12, inciso VI, da Lei nº 9.656/98 Dever de cobertura reconhecido Danos morais configurados Não bastasse o abalo emocional decorrente da enfermidade, o autor foi frustrado pela negativa de atendimento médico Verba indenizatória que não comporta redução Necessidade de cumprimento das finalidades punitiva e compensatória da reparação Sentença mantida RECURSO NÃO PROVIDO.


Trata-se de recurso de apelação interposto contra as sentenças de fls. 114/121 dos autos principais e fls. 100/107 da cautelar em apenso, de relatórios adotados, que julgaram as ações procedentes para condenar a ré a autorizar a cirurgia no hospital pretendido, bem como ao pagamento de indenização por danos morais ao autor no valor de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais).

Inconformada, apela a ré alegando, em resumo, que a unidade escolhida pelo autor não é credenciada ao seu plano; que o contrato prevê atendimento apenas na rede conveniada; que o dever de saúde incumbe ao Estado; e que não houve configuração de danos morais. Alternativamente, requer a redução do valor da indenização (fls. 123/131 dos autos principais e fls. 109/117 do apenso).Recebidos (fls. 169 dos autos principais e fls. 120 do apenso). Contrarrazões apresentadas somente nos autos principais (fls. 138/148).

É o relatório.

Consta dos autos que o autor precisou se submeter a cirurgia para tratamento de câncer na garganta, havendo recomendação do Hospital Alvorada de Moema para a realização do procedimento, sendo que a ré negou autorização sob o argumento de que a unidade escolhida não pertence à rede credenciada do seu plano de saúde.

Restou evidente que a escolha do nosocômio em questão não decorreu de livre preferência do autor, mas sim, exclusivamente, do esclarecimento do seu médico assistente acerca da ausência de todos os recursos necessários na unidade de Santo Amaro.

Assim, a obrigação de utilização da rede conveniada, embora em princípio válida, não pode prevalecer no presente caso, pois a busca pela vida e pela integridade física transcende a ela. A cobertura do atendimento quando a rede credenciada não oferece o tratamento adequado trata-se de exigência da Lei nº 9.656/98, que assim dispõe:

Art. 12. São facultadas a oferta, a contratação e a vigência dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei, nas segmentações previstas nos incisos I a IV deste artigo, respeitadas as respectivas amplitudes de cobertura definidas no plano-referência de que trata o art. 10, segundo as seguintes exigências mínimas:

VI - reembolso, em todos os tipos de produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei, nos limites das obrigações contratuais, das despesas efetuadas pelo beneficiário

com assistência à saúde, em casos de urgência ou emergência, quando não for possível a utilização dos serviços próprios, contratados, credenciados ou referenciados pelas operadoras, de acordo com a relação de preços de serviços médicos e hospitalares praticados pelo respectivo produto, pagáveis no prazo máximo de trinta dias após a entrega da documentação adequada.



Neste sentido já se manifestou este Egrégio Tribunal de Justiça em julgamento de casos análogos:

“PLANO de SAÚDE. Cerceamento de defesa. Suficiência da prova documental ao eguacionamento da lide. Afastamento da alegação. Aplicação do disposto no artigo 330, inciso I, do Código de Processo Civil. Diagnóstico de "Tumor Neuro Ectodérmico" (PNET). Insuficiência da rede credenciada da recorrente em Porto Alegre para o tratamento indicado à paciente. Indicação do Hospital Sírio Libanês para a realização do tratamento necessitado. Obrigação da apelante em custear o tratamento realizado no HSL. Precedentes da Câmara. HSL credenciado pela Unimed Paulista, empresa do conglomerado Unimed, também integrado pela recorrente. Necessidade, à vista da urgência que envolvia o caso, da utilização dos Hospitais em São Paulo, sem qualquer limitação. Custo a ser arcado pela recorrente em função do desaparelhamento da sua rede em Porto Alegre. Verba honorária. Arbitramento em consonância com o trabalho realizado pelos Patronos das autoras. Manutenção. Sentença preservada. APELO IMPROVIDO” (Apelação 9079031-72.2007.8.26.0000 São Paulo, Rel. Donegá Morandini, 3ª Câmara de Direito Privado, julgado em 02/12/2008).


“É certo que a autora utilizou-se de hospital não credenciado pela ré, mas também é certo que tal atitude mostrou-se indispensável à preservação da sua vida, posto não possuir o hospital credenciado pela ré os meios necessários para o atendimento. Aliás, a apelada, no momento oportuno, sequer ofereceu contrariedade a tal argumento, deixando de demonstrar, como lhe competia, que possuía recursos necessários para atender à situação apresentada pela autora. Portanto, em razão da urgência na realização dos procedimentos, bem como da cirurgia, visando a redução das dores insuportáveis que atingiam a cabeça da autora, e considerando que aquele hospital credenciado não atendia as necessidades da autora, justificava-se que fosse ela procurar hospital especializado para tanto. A ré tem obrigação contratual de dar cobertura ao tratamento necessário para a autora e não se justifica que se recuse ao simples argumento de que o Hospital Nove de Julho não é credenciado“ (Apelação 9060981-27.2009.8.26.0000 São Paulo, Rel. Beretta da Silveira, 3ª Câmara de Direito Privado, julgado em 25/08/2009).


Frise-se que a ré não negou o fato de que a unidade de Santo Amaro não dispõe de recursos necessários para a cirurgia indicada. Além disso, apesar de apresentar uma lista com 16 (dezesseis) outras opções de hospitais, não comprovou possuir algum deles a tecnologia adequada. Assim, a procedência da ação justifica-se pelo fato de que a rede credenciada não era apta a oferecer o tratamento necessário. A despeito de a saúde ser dever do Estado, cumpre asseverar que, ao operar com o sistema de saúde, a ré tem que se sujeitar às normas imperativas referentes à atividade. Não obstante buscar lucros -

o que é natural em economia capitalista - assume a operadora privada parcela da responsabilidade constitucional de promoção da saúde.

Por fim, cumpre a manutenção também da condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais ao autor. A negativa da ré configurou prática de ato ilícito, nos termos do artigo 186 do Código Civil. Justifica-se, assim, a obrigação de indenizar, por força do artigo 927 do Código Civil, sendo inequívocos os sérios transtornos a que fica submetida a pessoa que recebe negativa de atendimento médico.

Não bastasse a dor e angústia próprias da situação de enfermidade, a inesperada recusa de atendimento, quando acreditava estar o autor, ao menos, amparado pelo plano de saúde, lhe trouxe outra grande frustração, além do temor de não restabelecer sua saúde.

No tocante ao valor arbitrado a título de dano moral, o Direito não estabelece um critério único e objetivo para sua fixação. Cabe, assim, ao prudente arbítrio do Juiz a fixação do respectivo valor, o qual, a toda evidência, deve ser moderado e, normalmente, leva em consideração a posição social do ofensor e do ofendido, a intensidade do ânimo de ofender, a gravidade e a repercussão da ofensa.

O valor da indenização deve guardar perfeita correspondência com a gravidade objetiva do fato e de seu efeito lesivo, bem como com as condições sociais e econômicas da vítima e do autor da ofensa, em tal medida que, por um lado, não signifique enriquecimento do ofendido e, por outro, produza no causador do mal impacto bastante para dissuadi-lo de nova prática ilícita.

Diante de todos os fatores apresentados, considerando o caráter punitivo e intimidativo da indenização, levando-se, ainda, em consideração, as condições do ofendido e da ofensora, a quantia fixada pelo douto magistrado a quo não comporta redução, pois adequada para o cumprimento das finalidades supracitadas. Por fim, em relação ao pedido de aplicação de multa, formulado pelo autor em suas contrarrazões, cumpre esclarecer que não é possível imputar intuito procrastinatório à ré, pois para sua configuração é necessária prova segura de dolo com vistas a atuar de forma temerária no processo.

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso.

ELCIO TRUJILLO
Relator

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